Quem segue o ComRegras sabe que o Manuel Cabeça escreve para esta casa às 2ª feiras. Costumo consultar o seu blogue pessoal que confesso tem um estilo mais pessoal e logo menos formal e que quem me conhece sabe que assim prefiro. Deixo-vos 3 apontamentos do Manuel que mais não são 3 factos de quem anda e sente a escola pública no seu dia-a-dia.
coisas da indisciplina – ou da sua recorrência
enquanto estive por outro lado, foram paletes as contas sobre a indisciplina – tudo por causa de um apontamento – e que apontamento – de todo em todo pertinente, mas…
como curioso pelas questões da indisciplina fico algo perplexo por, nesta altura da vida das escolas se continuar a considerar a indisciplina per si, enquanto objeto de atenção;
ora considero que a indisciplina está para a escola como a febre para o nosso organismo, é um sintoma de algum desequilíbrio, não o dado em si mesmo;
pegue-se-lhe por onde der, por onde calhar, a indisciplina representa, na escola (e em qualquer contexto social) um desequilíbrio;
a indisciplina pode ser visto assim, por si e enquanto ação ou situação, mas precisa-se de ir mais longe, daí a dificuldade de se identificar um antídoto,
coisas das ideias e dos valores
simples conversa entre três docentes; não era hora de café mas quase;
um comenta sobre o papel dos professores no (in)sucesso dos alunos; outro diz assim, outro assado;
monta-se uma conversa onde circulam mais que meras ou simples opiniões, são mesmo ideias de escola e de docente, como ideias de aluno e de (ou do) trabalho escolar;
facilmente se percebe que numa amena cavaqueira o que mais há de diferente são valores sobre a escola, a forma como cada um a vê, sente, percepciona e trabalha;
não havendo estratégias de articulação destas diferenças – sempre saudáveis e úteis, desde que não sirvam de forças de bloqueio – então o pessoal fica acantonado cada qual a seu lado e no seu canto;
e depois dizem que é das políticas e dos governos – também é, mas deve-se muito mais à inexistência de pontes e de consensos em termos locais;
coisas do insucesso
durante praticamente três anos acompanhei um grupo/turma de percurso curricular alternativo;
este ano estou com dois grupos de curso vocacional;
têm, entre eles, traços comuns, o desinteresse, a indiferença, algum alheamento perante as disciplinas, o trabalho em sala de aula e, de certo modo, pela escola que pouco ou nada lhes diz; comum também o insucesso, as retenções, a aprendizagem;
antes pesquisei, inquiri e apresentei três ou quatro trabalhos; este ano vá de fazer o mesmo, tentar perceber aquele que é o meu contexto profissional;
tenho feito perguntas e percebido o quão difícil é fazer perguntas, pelo menos perguntas que estejam na origem de uma conversa;
dou por mim a configurar aquele que tem sido o meu objeto de investigação há já algum tempo, o processo de transformação do aluno em cidadão social, o papel da ação escolar, dos professores, a (re)configuração de instrumentos e das estratégias fruto dos tempos e dos modos (de ser aluno como de ser docente e/ou cidadão);
mas agora dou por mim a perceber que procuro perceber e estudar o insucesso, o que move o aluno à inação, à indiferença, à retenção;
há pouco, em conversa com um dos grupos de vocacional houve quem me afirmasse o insucesso como coisa “natural” e “normal”, porque, afirmou “sempre foi assim” – quando, passo a passo, ano a ano, recuei no seu processo de escolaridade deu conta que nem sempre foi assim; mas a coisa ficou “naturalizada” e hoje “é assim” – terá de ser assim?;
mas também deu para perceber as dimensões docentes envolvidas e, neste aspeto, afirmam que os professores não mudaram, são os mesmos, o que mudaram foram as regras de avaliação;
então precisarão os docentes de um enquadramento diferente para agirem diferente?
perante um curso regular não podem os docentes (re)criar modos e processos, instrumentos e critérios mais… flexíveis, adaptados a quem têm pela frente?