Enquanto meros projetos de adultos tínhamos como objetivo primordial a afirmação pessoal e/ou coletiva. A linguagem foi, é e será sempre um meio preferencial de diferenciação. Apesar de não ser nenhum investigador na matéria lembro-me bem dos bués, dos tá-se e dos tótil, entrando frase sim, frase sim. Na geração dos meus pais, um dos exemplos dessa diferenciação foi a linguagem dos “p” – baseava-se no inclusão de um “p” depois de uma vogal e com repetição da vogal anterior, ex: cadeira era pronunciada como capadepeipirapa – que virou moda e que por curiosidade cheguei a aprender. Agora estamos claramente na geração “k”, onde os kem, kuantos e komo são prática comum não tanto na linguagem oral mas principal na escrita. Aliás, esta geração diferencia-se claramente das anteriores pois utiliza a linguagem escrita e visual como linguagem primordial.
Os adultos esforçam-se por acompanhar os sinais dos tempos mas não é fácil, nada fácil mesmo. Se acrescentarmos a evolução tecnológica e toda uma panóplia de novas palavras, estamos perante um cocktail linguístico sem catálogo, nem manual de instruções.
Se te entender sou fixe, estou “in”, curtes-me à brava e assim sou tótil e um cota porreiro.
Se és capaz de pensar assim, então nem precisas de te esforçar, estás claramente in the zone… A linguagem é um excelente veículo de aproximação e geradora de empatia. E agora entramos no busílis da questão…
Na minha perspetiva, um dos principais potenciadores de indisciplina quer na escola quer em casa, estão relacionados com a falta de comunicação/empatia entre graúdos e miúdos. Apesar dos miúdos não reconhecerem, estes apreciam o esforço que fazemos para estar a par do seu mundo ultra-mega-super-híper-rápido, é como adquirirmos um bilhete que dá acesso ao seu círculo comunicacional.
Se nos interessarmos e abordarmos temas que lhes são interessantes acendemos de forma natural a chama da empatia. E a empatia é o primeiro bloqueador para atos de indisciplina. Passamos a ser os fixes e não é fixe chatear o cota pois ele até é curtes.
Não é um ato de submissão, é um ato de inteligência para atingir um fim.
Ontem, num âmbito claramente diferente, experienciei um momento de desfasamento linguístico geracional o que permitiu umas belas risadas à hora de jantar e que agora partilho com a devida autorização da minha progenitora:
Mãe – Filho amanhã vê se me passas as coisas para o Antunes…
Eu -….
Eu – Antunes???
Mãe – Sim! O teu irmão disse para passares as fotos para o Antunes!
Eu – Antunes???
( tento perceber qual a palavra em inglês que ela estava a dizer…)
Eu – Ahhhh!!! O iTunes!!!
Mãe – Sim essa coisa…
(Risada geral)
Eu – Não precisas porque as fotos estão na Cloud…
Mãe – Mas o mano não disse nada da Cláudia…
Eu – Cláudia????
Mãe – Sim, isso que disseste.
Eu – Ahhh, a Cloud…(risos)
Mãe – Sim a Cláudia…
A minha mãe é uma cota, bué da fixe, que apesar das suas limitações à língua estrangeira e novas tecnologias, tem aquilo que nos permite evoluir, uma curiosidade intrínseca e vontade em conhecer coisas novas. Abandonar o comboio da evolução é estagnar na paragem da solidão e num mundo que gira cada vez mais depressa, permanecer socialmente ativo é um seguro de vida, nem que seja numas das últimas carruagens.
Seja felizes, comuniquem!
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