Confesso que em privado já mostrei a minha preocupação de no próximo ano as Escolas fecharem-se sobre si e não fornecerem os dados disciplinares para tratamento estatístico. Apesar do cuidado que tive para proteger a sua identidade, sei bem o risco que corri e o que tem como objetivo conhecer a verdadeira dimensão da indisciplina em Portugal, bem como alertar e forçar a tutela/escolas a terem uma abordagem mais “profissional”, pode ser confundido como um ataque à Escola Pública. Nada mais longe da verdade, a Escola Pública precisa de ser defendida e tal só pode acontecer se esta for transparente e mostrar realismo e organização.
Fica um excelente texto do Bravio
O Iceberg da Indisciplina
O blogue ComRegras publicou, há dias, resultados de um estudo pioneiro no âmbito dos registos de indisciplina nas nossas escolas. São dados importantes, porque, para além de constituírem a primeira radiografia deste cancro escolar, focalizam uma intumescência grave, que necessita de uma terapia de choque. É necessário dar continuidade e alento a essa iniciativa. No entanto, convém não termos demasiadas ilusões, sermos realistas quanto baste, termos uma clara perceção dos limites deste tipo de abordagem e dos riscos inerentes a esta súbita e “mediática” atenção dada ao problema.
Os dados obtidos pelo ComRegras são — não tenho dúvida nenhuma — apenas uma pequena saliência de um gigantesco iceberg. E não acredito que, apenas com este método, seja possível trazer à tona o que está pesadamente submerso. A participação disciplinar é uma espécie rara, em vias de extinção, com caça aberta e desenfreada durante nove meses por ano. Descansa três, devido à migração sazonal. Serão muitas — creio eu — as escolas que já inventaram “outros procedimentos” substitutivos: queixinha oral, folhas com grelhas de queixinhas nos livros de ponto, “telegramas de ocorrências”… Enfim, pró-formas, coisas assaz descartáveis, com intenso odor a provisório. As escolas que têm tudo informatizado também terão artes idênticas — creio eu — uma vez que os computadores ainda não são completamente autónomos. Registam e apagam segundo a nossa superior vontade.
As passerelles da avaliação externa, as compensações dadas pela exibição de determinadas percentagens, as pressões vindas de todos os lados — das quais a mais inexorável, na última década, tem sido a da tutela, com o constante apontar do dedo aos professores, ignorando as criminosas consequências de tal atitude — têm feito grassar, com todo o vigor, a indisciplina nas escolas. Estas, com tantas frentes de combate para alimentar, têm cedido, dia após dia, deixando crescer esse monstro nas penumbras. Em muitos casos, só transparece o que não pode mesmo ser negado ou obnubilado. E é apenas esta parcela que está ao dispor dos estudos quantitativos.
Para além deste sumaríssimo elenco de fatores que condicionam a abordagem a este complexo problema, convém não esquecer que a palavra “indisciplina” sofreu muitas cambiantes de sentido nos últimos tempos. Há tantos, tantos e tantos comportamentos que deixaram de ser considerados indisciplinados… Há tantas, tantas e tantas concessões erradamente feitas aos alunos neste campo… Em cada escola — para isso, tem chegado a autonomia — tem-se vindo a fazer uma certa “jurisprudência ética”, uma espécie de moralidade vigente não explícita, mas tacitamente aceite, ou subtilmente imposta ao coletivo docente. Muitos são os que ocultam a indisciplina, que a esmoem, que a ingerem, que a tatuam nos neurónios, que se lançam sobre ela para a abafar, com prejuízo do seu corpo e da sua alma. Aqueles que se negam a fazer as concessões consignadas na “cartilha ética implícita” são olhados de soslaio pelos pares, vistos e tidos como retrógrados, desfasados, do contra… De forma mais ou menos subtil, a máquina tenta desautorizá-los, seja através de um falso encaminhamento das participações, seja através de uma envernizada condescendência ou de outros expedientes. Não sei, por outro lado, se todas as participações resistem à travessia do deserto.
Há, entre os professores (os que são diretores e os que não são, os que são diretores e turma e os que não são), por diferentíssimos motivos, por variadíssimos interesses, uma extensa autoestrada de desautorizações em cadeia. Um mar de palavras a dizer, que não cabem neste já longo artigo (mas não ficarão no silêncio). Resumo numa comparação: é como quando pai e mãe se desautorizam diante dos filhos.
Concluo, expressando o meu receio de que este alarde em torno da indisciplina espante a caça toda. Explico: temo que uma vitrina da indisciplina estimule ainda mais as artes mágicas acima indiciadas e nos conduza à indisciplina eterna. Porquê? Porque o sucesso tem que ser, e o que tem que ser tem muita força!
PS – Em futuros artigos, terei de abordar os restantes contribuintes da indisciplina: pais e encarregados de educação, alunos e Ministério da Educação.
Luís Costa
Subscrevo.
É assustadora a Indisciplina que reina nas Escolas e que tão normalmente………….. não é controlada….
E já está nas ruas, nos cafés….na vida de todos em todo o lado!!!!
Viva o Com Regras!!!!